"Eu fico feliz que não consegui memorizar o teu cheiro, se isso tivesse acontecido eu desejaria uma gripe eterna para não sentir o cheiro de mais nada que me lembrasse de ti.
Eu agradeço que não descobri o toque dos teus dedos, agradeço que não sei se tua pele é suave ou grossa, assim eu não ficarei desejando te sentir novamente, lembrando de como era seu toque e como ele me faria arrepiar.
Eu tenho sorte de não ter provado teus beijos, assim eu não posso ficar pensando no quanto eles devem ser quentes e com gosto de 'tudo o que há de bom'.
Ainda bem que eu não me familiarizei com o som da tua voz, assim eu não preciso ficar lembrando se ela era agradavelmente grossa ou até mesmo suave, de qualquer entonação que combinasse perfeitamente com o arquear de sobrancelhas que eu provavelmente não sei se tens o costume de fazer.
Eu agradeço não ter gravado o teu modo de falar, seja ele rápido ou lento, seja ele relaxado ou animado (provavelmente relaxado), assim eu tenho certeza que não irei ansiar por te ouvir falar do que quer que te deixa alegre ou tedioso.
É, eu realmente fico feliz de não ter decorado os teus gostos, assim, eu vou conseguir acordar e olhar para as coisas, os lugares, as pessoas no meu caminho e não irei lembrar de ti.
Imagine só se eu decoro tuas manias? Do jeito que eu sou, iria olhar para qualquer coisa e iria falar: "Ele adora fazer isso!" ou "Ele detesta isso!" Eu sei que iria lembrar por pura diversão e carinho por ti.
Acho que tenho que ir na basílica, rezar e agradecer à minha Santa Mãe que eu não passei tardes e noites contigo, assim eu não tenho bons momentos para lembrar, nem bons, nem incríveis, nem memoráveis, nem nada.
Ainda bem que minha memória é péssima, assim eu não lembro de sorrisos especiais de momentos únicos, nem me lembro de risadas engraçadas ou até mesmo horríveis.
Imagine só se houvesse uma piada interna? Que seria de mim, a única a rir de algo que mais ninguém iria entender?! É, seria vergonhoso!
Eu fico grata que você não se esforçou tanto pra conseguir todas essas coisas em tão pouco tempo, por que o meu peso na consciência estaria insuportável.
Frustração? Culpa? Peso? Não...
Vontade? inexistente!
Não fui tão instigada a sentir isso, nem fui levada a despender meu tempo e sentimento à isso tudo e escrever estas linhas sem o mínimo rastro ou cheiro de sentimento.
Não, eu apenas me sentei no chão frio do meu quarto e fiquei a observar o céu pela janela, imaginando todo o universo que ali existia, e a tentar calcular quantas e(n)strelinhas seriam necessárias para me separar do tal Sr. que me apossou com um apego tão apegado, porém igualmente superficial.
Veja só, sinto como se estivesse doente.
E estou doente, e acho que vou encontrar o remédio no fundo daquela garrafinha de Whisky que eu comprei na loja de conveniências e quem sabe nos filtros de alguns cigarros?
É, já era de se esperar que eu fosse deixar você ir antes mesmo que eu me intoxicasse com toda a sua bagagem.
Boa noite, Sr."